AGT cria ″negócio″ livre de impostos que pode render 100 mil Kz por mês
A medida visa dar uma fonte de receita a quem resida a 10 km da fronteira, mas poderá "provocar escassez no resto do país" e "agravar ainda mais as distorções de mercado", adverte Alves da Rocha. O economista receia ainda que os "beneficiários directos e imediatos" acabarão por ser os comerciantes.

Os cidadãos que residam a 10 quilómetros da fronteira podem comprar até 20 litros semanais de gasolina e 20 litros de gasóleo e vender nos países vizinhos, como a Zâmbia, onde chegam a custar quatro vezes mais, arrecadando uma receita mensal superior a 100 mil Kz, livre de impostos e sem estarem sujeitos às regras e procedimentos aplicáveis aos exportadores certificados.

A medida, regulamentada pelo Instrutivo 001/2022 da Administração Geral Tributária (AGT), visa dar aos "residentes fronteiriços" uma fonte de receita para as suas "necessidades de subsistência", mas, na prática, significa um subsídio indirecto, já que a gasolina e o gasóleo são produtos subsidiados a 68,9% pelo Estado, deixando todos os que residem a mais de 11 quilómetros da fronteira sem direito ao mesmo benefício.

Trata-se, pois, de uma medida "apropriada à situação presente de campanha eleitoral", mas que gera desigualdade e "pode introduzir distorções nos mecanismos de formação dos preços dos produtos deste sector", como conclui o economista Alves da Rocha. "Os vendedores angolanos de combustíveis seguramente não irão abdicar dos potenciais ganhos ocasionados pelas isenções", por isso, "pode ocorrer um desvio significativo de quantidades de derivados de petróleo para estas zonas limítrofes, o que poderá provocar escassez no resto do País, agravando-se ainda mais as distorções de mercado", adverte o director do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica de Angola.

Alterações na oferta

Alves da Rocha olha com enorme desconfiança para este regime de excepção, argumentando que ele "pode provocar movimentos de pessoas para as zonas fronteiriças beneficiadas com a medida" e tem potencial para desencadear "alterações, mesmo que pequenas, no perfil da oferta de bens e serviços angolanos", dependendo da duração da medida, uma vez que "os subsídios aos preços dos combustíveis em Angola têm de acabar".

Recorde-se que Angola é o país da região com o preço mais baixo dos combustíveis, graças à subsidiação do Estado. No ano passado, o país gastou 1.465 mil milhões Kz com a importação de gasolina e gasóleo, de acordo com a publicação trimestral dos custos com combustíveis e subsídios do Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE. Ao todo, este valor foi subsidiado em 1.003 mil milhões Kz pelo Estado (68,5%), para permitir que a gasolina chegue ao consumidor a 160 Kz e o gasóleo a 135 Kz.

Livre de impostos e taxas

O Instrutivo 001/2022, assinado a 11 de Fevereiro de 2022 pelo presidente do Conselho de Administração da AGT, José Leiria, dispensa os residentes fronteiriços do cumprimento das regras e procedimentos para a exportação de combustíveis, reguladas pelo Decreto Executivo n.º 140/22 de 24 de Fevereiro, do Ministério dos Recursos Minerais, nomeadamente a autorização de exportação prévia e a obrigatoriedade de dispor de instalações de armazenamento devidamente autorizadas.

Além da isenção do imposto sobre exportação, com uma incidência de 135% sobre o preço tabelado, os moradores ficam dispensados do pagamento de direitos aduaneiros, taxas e sobretaxas, definidas pelo Decreto Presidencial n.º 170/21, de 5 de Julho.

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