Sem subsídios, 3 em cada 4 empresas públicas não conseguem financiar as suas operações
Com as receitas petrolíferas em queda há 10 anos, a pressão para a concretização de reformas profundas no Sector Empresarial Público (SEP) ganha força. No entanto, o Governo parece estar refém dos custos políticos associados a este tipo de mudanças, que também podiam pôr em causa negócios particulares.

Entre as 72 empresas do Sector Empresarial Público (SEP) que apresentam regularmente os seus relatórios e contas, apenas 18 entidades (25,4%) demonstram ter receitas operacionais que cobrem as suas despesas operacionais. No total, sem subsídios públicos, o SEP em 2022 teve um resultado operacional negativo de 776 mil milhões Kz. Caso sejam contabilizados os subsídios concedidos no referido período, o resultado operacional é positivo em 1,58 biliões Kz, com a Sonangol a valer 98,4% destes resultados. Vinte empresas públicas continuam sem publicar relatórios anuais.

Em termos agregados, o SEP em 2022 contabilizou receitas operacionais (rubrica que regista as vendas e os serviços prestados por cada empresa) de 8,75 biliões Kz e despesas (entre custos com o pessoal, água, luz, entre outros, exceptuando impostos) de 7,17 biliões Kz. Se houver dúvidas sobre a profundidade da doença holandesa em Angola, basta referir que a empresa que obteve mais receitas foi a Sonangol, com 6,23 biliões Kz, seguida a larga distância pela Sodiam, com "apenas" 981 mil milhões Kz. A Unitel fechou o pódio das receitas operacionais, em 2022, com 356 mil milhões Kz.

No caso da empresa petrolífera de capitais públicos, os resultados positivos têm uma curiosidade, como é possível constatar no último relatório financeiro disponível: a Sonangol contabiliza como "venda" ou receita operacional os subsídios aos preços dos combustíveis, realidade que pode ser polémica e levantar algumas dúvidas sobre a qualidade da prestação de contas. Sem os subsídios, o resultado operacional da Sonangol teria sido negativo em 566 mil milhões Kz, isto porque a petrolífera importa os combustíveis que são vendidos depois no País a preços bastante abaixo dos de mercado. E por isso recebe, mais tarde, os subsídios do Estado que depois acaba por contabilizar como vendas.

Entre os maiores resultados operacionais negativos registados pelo IGAPE estão a ENDE, com 88 mil milhões Kz, a Endiama, com 34 mil milhões Kz, e o Grupo Zahara, com quase 9 mil milhões Kz. A Endiama apresenta resultados positivos no exercício de 2022 porque compensa os elevados prejuízos operacionais com os proveitos não-operacionais.

O caso da empresa de distribuição de energia pode ser um bom exemplo para analisar o papel das empresas públicas. Por um lado, pode ser pacífico, em determinados contextos, que uma empresa pública, mesmo quando possui o monopólio de um serviço essencial e procurado por todos, possa registar prejuízos decorrentes da sua actividade tradicional. Estes resultados negativos devem estar suportados em evidências (questões técnico-operacionais, de mercado, de contexto, da necessidade de realizar novos investimentos, entre outras) e em procedimentos correctos ao nível da gestão.

Segundo as justificações do IGAPE, no relatório agregado sobre 2022, a empresa "teve uma redução na sua facturação em decorrência" do incremento das provisões de cobranças duvidosas (+ 63,2%, fixando-se em 36 mil milhões Kz), "por conta da insuficiência do procedimento de controlo interno para o reconhecimento de créditos no negócio de pós-pago, aumento dos custos com o pessoal em 24,5% e constituição de provisões sobre a totalidade dos subsídios a preços".

Conveniências políticas

Na opinião de Fernandes Wanda, actual coordenador do Centro de Investigação Social e Económica da Universidade Agostinho Neto, é preciso compreender "que nada na teoria económica diz que uma empresa do SEP é sempre (necessariamente) menos eficiente e rentável que uma privada".

"Se assim fosse, por exemplo, a Ethiopian Airlines (uma empresa pública etíope) não seria a melhor companhia aérea de África. O que devemos questionar é o que motiva a não prestação de contas e que medidas têm sido tomadas para alterar esse cenário. Em Angola, muitos gestores do SEP são indicados por conveniência política, o que torna difícil depois fazer-se a devida cobrança de resultados ou penalizar os responsáveis em caso de má prestação", considera o economista. "Os gestores das empresas do SEP precisam de ter objectivos e metas (com horizonte temporal) bem definidas, e de estar sujeitos a avaliações periódicas. De contrário, dificilmente vão cumprir com o seu papel", sublinha Fernandes Wanda.

REAÇÕES

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