População trava a fome comendo farelo
No município do Chongóroi, em Benguela, a população está a alimentar- se de farelo devido à falta de comida.

As informações vindas daquela congregação afecta à Igreja Católica apontam para o facto de dezenas de famílias estarem a dividir farelo com os animais como consequência da estiagem, um quadro que, de resto, não agrada o ISFA, daí ter decidido denunciar o caso, na esperança de que o grito de socorro “dos que não têm voz” chegue efectivamente a quem de direito.

De acordo com o irmão Marcelino Muhepe, o quadro é preocupante, por isso sugere que se decrete um “Estado de Emergência” especificamente para aquela área. “No Chongorói, de facto, as pessoas sobrevivem de farelo, porque nem todos têm a possibilidade de conseguir alimento. Isso eu vi, ninguém me falou”, sublinha, convicto na sua afirmação.

Nos últimos tempos, segundo Marcelino Muhepe, a sua organização religiosa, movida por apoios de comunidades europeias, tem vindo a gizar projectos no ramo agro-pecuário que está a absorver algumas famílias carentes. Numa primeira fase, 10 já foram inseridas no referido projecto.

“O município precisa de uma ajuda humanitária. Andei pela comuna sede (Chongorói), aldeia de Kamukuyo, aldeias da Mapupa e Yanja e fui fazendo um diagnóstico e a situação é igualíssima”, considera.

O religioso refere que do diálogo mantido com várias famílias locais se afere que o cenário vivido é do conhecimento das autoridades locais, de tal sorte que estas têm vindo a proceder a cadastramento de famílias carenciadas para supostos apoios alimentícios, mas, “quando chega um pouco de comida, aquelas pessoas registadas acabam por ver os produtos na praça. Tanto que algumas pessoas já não aceitam se registar”, refere, salientando, contudo, que a questão da fome remonta ao início da pandemia.

O administrador municipal do Chongorói, Herculano Neto, desmentiu, em entrevista telefónica ao jornal OPAÍS, as informações de que a sua região teria registo de pessoas a alimentarem-se de um produto destinado a porcos, devido à carência de alimentos.

“Ainda acabámos (às 11h:12 do dia 24) de ter uma reunião de auscultação, isso não corresponde à verdade. Aqui, nós temos a Missão de Manongue, que fica 24 quilómetros, temos a Missão de Ochongo. Temos sempre contactos com outros padres. Eu não confirmo esta informação”, disse o administrador, manifestando, porém, desconhecimento da existência da congregação dos Irmãos Franciscanos em seu território.

Mas, apesar disso, o governante admite haver fome na municipalidade sob sua jurisdição, por ser, como disse, um problema “conjuntural. Não é que não tenham nenhum sustento a ponto de comerem farelo”, repudia.

Entretanto, uma fonte da Administração da Municipal do Chongorói confidenciou a este Jornal a existência de um número considerável de cidadãos obrigados a comer farelo devido à carência de alimento na localidade, agravada com a situação da pandemia, associada à estiagem registada.

De acordo com a mesma fonte, que falou na condição de anonimato, este facto estaria a provocar êxodo rural, na medida em que alguns cidadãos estão a abandonar as suas zonas de origem em direcção ao Dombe-Grande, município da Baía-Farta, para trabalhar em fazendas.

A fonte esclareceu a OPAÍS que o consumo de farelo estará a causar doenças diarreicas, fundamentalmente em crianças. Curiosamente, horas depois de o irmão Muhepe ter feito a denúncia, o secretário provincial da CASA- CE, Zeferino Cuvíngua, chamava a imprensa para considerar de desumano o facto de cidadãos, no município no Chongorói, estarem a alimentar-se de farelo, “numa clara disputa com porcos”.

O político esteve recentemente a cumprir uma agenda de trabalho no município do Chongorói e diz ter constatado aquilo a que chamou de triste realidade que apoquenta alguns cidadãos. “18 anos de paz não era suposto que as pessoas dividissem alimentação com porcos, comendo farelo. Nós culpamos a administração, porque não teve visão de prever o futuro”, disse.

Uma narrativa, desde já, que contraria, em certa medida, a posição manifestada pelo administrador local de que não há ninguém a comer alimentos destinados aos porcos.

Neste diapasão, Zeferino Cuvíngua lamenta o facto de o governo provincial ter, supostamente, ignorado um relatório bastante exaustivo elaborado pela sua organização, em 2019, que alertava para a necessidade de se prestar maior atenção a problemas como este que, num futuro próximo, afectaria, fundamentalmente, os municípios do interior, daí que responsabilize as autoridades locais. Saliente-se que o KWENDA, programa de transferências financeiras, orçado em 400 milhões de dólares, abarca, numa primeira fase, a nível de Benguela, os municípios do Chongorói e a Ganda, segundo o Fundo de Apoio Social.

Gentileza OPaís

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