Governo gastou 560 mil milhões Kz a mais em Defesa e Segurança do que o orçamentado
São cerca de 1.220 milhões USD (à taxa de câmbio média do ano passado) a mais só para "militares e polícias" e menos 780 milhões para Educação e Saúde em relação ao que estava orçamentado. Já no I trimestre deste ano mantém-se o estatuto quase intocável de Defesa e Segurança numa altura em que o Governo "apertou o cinto".

O Orçamento Geral do Estado (OGE) 2022 tinha previsto despesas de pouco mais de 1,5 biliões Kz para Defesa e Segurança, mas o Governo acabou por executar quase 2,1 biliões Kz. Contas feitas, de acordo com cálculos do Expansão com base nos relatórios de execução orçamental sobre o OGE 2022, publicados com vários meses de atraso, foram executados 560 mil milhões Kz a mais em Defesa e Segurança, ao contrário do que aconteceu na Educação e Saúde, que mais uma vez viram a execução longe do que estava inicialmente orçamentado.

Se em 2021 tinha sido a primeira vez que o Executivo conseguiu equilibrar os gastos entre Defesa e Segurança e Educação e Saúde (ver gráficos), depois de os dois blocos terem ficado com 10,8% da despesa total do OGE, no ano seguinte voltou tudo ao "normal". De acordo com cálculos do Expansão com base nos relatórios de execução orçamental trimestrais publicados no site do Ministério das Finanças, em 2022, a Defesa e Segurança ficou com 13,8% da despesa executada, enquanto Saúde e Educação juntas ficaram com 11,9%. Ainda assim, em 2022, os gastos com os sectores das "escolas e hospitais" até cresceram em termos percentuais face aos gastos totais, mas foram inferiores face ao que estava orçamentado. No OGE 2022, estava previsto quase 2,2 biliões Kz para Saúde e Educação juntas, mas no final do exercício financeiro apenas foram executados quase 1,8 biliões Kz, correspondendo a menos 356 mil milhões Kz.

A Saúde e a Educação são fundamentais para o desenvolvimento socioeconómico de um país já que os investimentos nestas duas áreas representam um investimento directo no desenvolvimento humano, na diminuição da pobreza e no crescimento sustentável. Em 2000, à semelhança de outros países, Angola comprometeu-se em Dakar, Senegal, durante o Fórum Mundial da Educação, que iria gastar com a Educação 20% das despesas públicas totais e no ano seguinte comprometeu-se em Abuja, Nigéria, a alocar 15% do OGE à Saúde. Mas, de lá para cá, nunca foram cumpridas estas metas assumidas lá fora, nem as assumidas internamente no Plano de Desenvolvimento Nacional 2018-2022, em que o Governo apontava a "aumentar gradualmente a afectação de recursos às funções Educação e Saúde, visando alcançar as proporções recomendadas internacionalmente e com as quais Angola se comprometeu". De acordo com cálculos do Expansão, para cumprir as metas assumidas lá fora, o Governo teria de gastar quase 6,4 biliões Kz em Educação e Saúde em 2022, ou seja, mais 4,6 biliões do que os quase 1,8 biliões Kz efectivamente executados.

O facto de se ter ultrapassado o orçamento previsto para a Defesa e Segurança e de não se ter executado as verbas orçamentadas para Educação e Saúde não é propriamente uma novidade em Angola. Desde 2017, apenas uma vez a execução na Defesa e Segurança "bateu" com o valor orçamentado, tendo inclusive ficado abaixo do que estava previsto. Contas feitas, desde 2017 já foram executados quase 1,6 biliões Kz a mais em Defesa e Segurança do que aquilo que estava orçamentado. Em sentido contrário, foram executados quase 1,8 biliões Kz a menos do que estava orçamentado para Educação e Saúde.

Para Fernandes Wanda, economista e investigador da Universidade Agostinho Neto, estes "atropelos" aos orçamentos gerais do Estado "têm sido alvo de crítica de muitos investigadores ligados aos centros de investigação". Isto só acontece porque "quem executa o OGE sabe que a sua acção, ou seja estas violações, não têm consequências". "Num contexto de paz, como o que Angola vive desde 2002, o arranjo político ainda favorece os elementos ligados aos órgãos de Defesa e Segurança. Por uma questão real ou fictícia de manutenção da estabilidade política, muitas das benesses acabam por ser mantidas. Mas até quando?", questiona.

Perante estes números, em que a Educação e Saúde continuam a ser os "parentes pobres" da execução orçamental, o economista revela que é um sinal que "mostra uma governação descomprometida com o bem-estar geral". E, por isso, "não é surpreendente vermos hoje como o acesso aos serviços de Saúde e Educação para grande parte da população se deteriorou".

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