Ligeiros proibidos e autocarros sem condições viajam nas asas da ″gasosa″
Os transportes ligeiros estão proibidos de efectuar serviços de longo curso desde 2014. Os donos das viaturas sabem-no, a polícia também, e por isso chegam sempre a um entendimento que permite a continuidade das operações. Ambos estão a cometer o crime de corrupção.

As viaturas que transportam passageiros entre as várias províncias do País e que partem dos terminais informais sobrevivem à ilegalidade através do "saldo" ("gasosa") que pagam aos agentes de trânsito nos vários controlos que surgem ao longo dos diferentes percursos no País. A taxa, que coloca os motoristas como parte activa numa prática criminal, varia de 1.000 a 3.000 Kz consoante o estado da viatura, o tempo de serviço do profissional informal e a infracção que o agente detectar.

"Ainda que não cometamos nenhuma infracção, temos de deixar pelo menos 1.000 Kz em cada controlo policial. Com estes valores já estás a garantir a amizade do agente e a evitar uma possível inspecção na sua viatura. E se for uma viatura ligeira pior ainda, por serem proibidas de fazer viagens comerciais de longo curso", relata ao Expansão o condutor de um jipe, com capacidade para 12 lugares, que se prepara para sair de um dos terminais do Mercado do 30, em Luanda, rumo à província do Huambo. Es[1]peram-no, pelo menos, 11 paragens em postos policiais.

Em 2014, o Governo proibiu as viaturas ligeiras de fazerem serviços de táxi de longo curso. A medida surgiu, na altura, para reduzir o alarmante número de acidentes. Mesmo assim, apesar de terem parado durante um certo período, nos últimos dois anos o número de ligeiros a prestar serviços de longo curso aumentou de forma considerável.

Só na manhã de segunda-feira, 30, no parque do conhecido empresário "Ti Show", no município de Viana, o Expansão constatou mais de 10 viaturas a carregarem passageiros para vários destinos: Huambo, Cuito, Malanje, N"Dalatando, entre outros. "Às vezes, o polícia só te complica quando és novo nesta actividade e é ali onde te pede mais dinheiro. Pode chegar mesmo aos 3 mil Kz. Mas com o tempo ganhas a amizade dele e depois vais deixando um valor simbólico de 500 ou 1.000 Kz", detalha um outro automobilista que faz o trajecto Luanda/Malanje.

Para o economista Mateus Maquiadi "o mercado dos transportes é realmente um grande empregador", apesar da decisão de retirar os carros ligeiros dos percursos mais longos. "Mesmo assim, antes de proibir, talvez com radares e outros mecanismos seja mais fácil monitorar e fiscalizar a actividade dos transportes públicos. Este negócio é muito lucrativo, é uma boa alternativa para os desempregados. Mas, em contrapartida, é de fácil corrupção", reconhece o economista.

Outros automobilistas e proprietários de viaturas queixam-se do excesso de controlos policiais nas estradas do País. E acusam os agentes da Polícia de formarem postos ou barreiras desordenadas para se aproveitarem dos homens do volante. Por exemplo, só no percurso Luanda/Huambo existem onze zonas de fiscalização, nomeadamente no 44, Catete, Maria Teresa, Dondo, Lussusso, Kibala, Waco, Cruzamento, Alto Hama, Chipipa e Benfica.

"Este comportamento da polícia não ajuda em nada o crescimento da própria economia do País. Estes gastos que os automobilistas fazem na via tornam a viagem mais cara e, em contrapartida, os produtos também ficam mais caros. A maior parte das pessoas que estes homens carregam são negociantes", sublinha um empresário que preferiu o anonimato.

Autocarros facturam mais de 1 milhão de Kz

Os autocarros interprovinciais que actuam no mercado informal chegam a facturar até 1,1 milhões Kz por viagem de Luanda ao Lubango (17 mil Kz por bilhete) e 508.000 Kz de Luanda ao Huambo (8.000 Kz). Estes indicadores incluem a facturação dos lugares de "sistema" ou "corredor" - lugares adaptados entre os bancos, normalmente preenchidos com pessoas que viajam com urgência ou que têm menos dinheiro. Aqui são admitidos descontos de 1.000 a 2.000 Kz por viagem.

Durante a semana, o Expan[1]são visitou cinco terminais informais interprovinciais, nomeadamente, Mercado do 30 - Parque do Águia, Ti Show em Viana, Rocha Pinto, Benfica e Kicolo. Todos estes parques cobram taxa de parque, em alguns casos a rondar os 70 mil Kz por autocarro. Tudo por via informal e sem qualquer factura. Nestes pontos, o anormal é visto como normal, ou seja, carregar acima da capacidade do transporte é do conhecimento de todos. Até dos clientes. Os mini-autocarros têm capacidade para 30 lugares mas levam 37 passageiros e chegam a encaixar, por uma viagem de Luanda ao Huambo, 267 mil Kz, considerando o preço oficial do bilhete a 7.500 Kz e de 6.000 Kz para os lugares do "sistema".

Do total do valor recolhido junto dos passageiros, descontam os gastos com a taxa de parque, combustível, "micha" ou "saldo" do agente de trânsito nos controlos e alimentação do motorista. No final da jornada, o rendimento líquido fixa-se em 50% da facturação. "As despesas são relativas e dependem de vários factores, por vezes gastamos mais e outras vezes gastamos menos. Há dias em que encontramos mais controlos e o agente da polícia pode cobrar 1.000 Kz. Outras vezes pedem muito mais do que isso, depende da infracção ou do estado da viatura", ressalva um dos motoristas ouvido pelo Expansão.

A Direcção Nacional de Viação e Trânsito para saber se tem conhecimento destas práticas e sobre as medidas em vigor para mitigar os casos de corrupção. No entanto, não foi possível obter uma resposta até ao fecho desta edição.

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